quarta-feira, 6 de Junho de 2012

Mónica Calle: «A intenção nunca foi fazer uma reprodução»


«Nua, completamente nua, perante nós, Mónica Calle regressa a A Virgem Doida, o texto de Rimbaud com que, há 20 anos, apresentou ao público a Casa Conveniente. Nua, completamente nua, e depois vestindo-se e depois voltando a ficar nua, tal como há 20 anos, embora tudo o resto seja diferente pois o espetáculo é outro e não se trata de uma recriação, trata-se de uma procura.

"A intenção nunca foi fazer uma reprodução", explica a encenadora. "Quis voltar a Rimbaud e voltar a colocar-me num sítio de questionamento, de exposição, de descoberta, de experiência. De desafio como atriz." Foi aí que se colocou e depois deixou-se ir. Para criar, Calle tem de se sentir livre. "Só assim é que faz sentido."

"Tive que fazer um grande esforço para me libertar do espetáculo de há 20 anos. Quando comecei a trabalhar percebi que o meu corpo tinha uma memória desse espetáculo, dos gestos, das palavras. E tive que fazer uma limpeza, uma descontaminação interior", conta. Mas isso não foi suficiente. A insatisfação persistiu até poucos dias antes da estreia, quando Mónica Calle estava a reformular todo o conceito. "Não estava a conseguir colocar o espetáculo num local de violência, de prazer, de experimentação, como gostaria. Há 20 anos só fiz A Virgem Doida, mas à medida que trabalhava percebi que para mim esse texto já não seria suficiente. Precisava de outros textos que me levassem para outros sítios."

A A Virgem Doida juntaram-se mais textos de Uma Cerveja no Inferno, de Rimbaud. "Em vez de fazer o percurso da 'virgem doida' vou fazer o meu percurso, o percurso que Rimbaud me permite." E explica: "Aquele espetáculo teve uma força muito grande naquela altura, mas hoje tem de ser diferente. As circunstâncias são outras, o país é outro, eu sou outra. Já não sou uma jovem de 25 anos, sou uma mulher a envelhecer, com um corpo com marcas, que teve filhos, que tem outra sexualidade, com um passado. Por isso, aquilo que era arriscado já não o é agora."

Mónica Calle escolheu o Cais do Sodré muito antes de ele estar na moda. A antiga Casa Conveniente era mais perto do mercado e tinha janelas. Esta, para onde se mudaram já há uns anos, fica mesmo em frente do Jamaica, na carismática rua Nova do Carvalho, é é um quarto escuro. Uma porta para uma casa velha, com as antigas filas de cadeira do Nacional, com os estofos vermelhos esburacados, e um bocado de chão a servir de palco. A proximidade entre o ator e o espetador é uma das marcas do seu trabalho.

A Virgem Doida estreou na semana passada mas para a atriz a procura continuará todas as noites. Até 10 de junho, o espetáculo será, tal como há 20 anos, apresentado em sessões contínuas. As pessoas podem entrar, sair, voltar. Podem acompanhá-la em todo o percurso ou apenas em parte. "Também há uma liberdade do espetador. E espero que consigam perceber ou sentir aquilo que quero transmitir com estas palavras que são tão fortes, tão poéticas."»

Ler no Diário de Notícias e no Público.

2 comentários:

DVD diz:
Este comentário foi removido pelo autor.

Excelente peça. A Mónica é fantástica!

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