sábado, 16 de Março de 2013

Perfil: Clint Eastwood


É um dos últimos duros do cinema. De cowboy imperturbável a agente impiedoso, adoptou a rispidez como imagem de marca e transformou-se num verdadeiro ícone. O tempo passou, mas o calo não o enfraqueceu e, na cadeira de realizador, continua a fazer jus ao estatuto de lenda. Saiba mais sobre Clint Eastwood nas 21 seguintes curiosidades.

Texto: Tiago Matos

Revenge of the Creature
Em 1955, estreava Revenge of the Creature. O filme, um thriller de ficção científica com John Agar e Lori Nelson nos principais papéis, assinalava o retorno do Monstro da Lagoa Negra, mas a única razão pela qual ainda é lembrado nos dias de hoje prende-se com uma pequena cena cómica, no início, que marca a estreia de um jovem Clint Eastwood no grande ecrã. Tão insignificante foi a participação que o seu nome nem sequer foi creditado no final, mas estava dado o primeiro passo de uma carreira considerada, meio século depois, uma das mais emblemáticas do cinema mundial.

Desnorte profissional
Contudo, nem sempre a actuação fez parte dos seus planos. Eastwood cresceu no seio de uma família de classe média, na Califórnia e, em época de Depressão, foi o desnorte profissional a marcar grande parte da sua juventude. Aos 20 anos, já tinha experiências como operário fabril, lenhador, bombeiro, gasolineiro e pianista. Foi então chamado ao Exército, por altura da Guerra da Coreia, mas o seu préstimo nas forças militares americanas passou unicamente pela instrução de natação. Foi lá, porém, que conheceu Martin Milner e David Janssen, actores que o encorajaram a seguir uma carreira na área da representação.

Rowdy Yates de Rawhide
Eastwood levou o conselho a sério. Nos anos que se seguiram à saída do corpo militar, foi conseguindo pequenos papéis em filmes da Universal. A qualidade destes era, porém, tão pobre que por pouco não o fizeram desistir em definitivo da profissão. Eis que um dia, em 1958, ao almoçar com um amigo, a sorte lhe sorriu. Um produtor da CBS reparou nele e achou-o perfeito para o papel de cowboy numa nova série televisiva planeada para a estação, chamada Rawhide. Nasceu assim Rowdy Yates, a personagem que Eastwood viria a desempenhar durante os sete anos seguintes e que lhe daria, por fim, alguma notoriedade.

O homem sem nome
Despertada a atenção da indústria, inclusive a nível internacional, associou-se ao realizador italiano Sergio Leone e tornou-se «o homem sem nome» na trilogia de westerns mais popular de sempre, que inclui aquele que é considerado um dos melhores filmes do século XX: Il Buono, il Brutto, il Cattivo. O seu estilo irreverente e a simplicidade instintiva que emprestou a todas as cenas impressionaram de tal forma o público que se criou à sua volta um mito de «homem sem medo». Aos olhos do mundo, não era apenas um papel. Clint Eastwood era um verdadeiro cowboy.

Dirty Harry
Em 1971, o currículo de Eastwood contava já com algumas interpretações diferentes, em particular as que foram conseguidas através da colaboração com o realizador Don Siegel, mas a sua imagem enquanto actor continuava a ser essencialmente associada a westerns. Eastwood necessitava de algo novo, e eis que surge Dirty Harry. O enredo acompanha Harry Callahan, um inspector da polícia que age à margem da lei na execução do seu dever. O estilo brusco do personagem e a sua luta contra a burocracia defensora dos criminosos era algo inédito na altura, e surge numa época em que a sociedade americana estava particularmente frustrada com a incapacidade demonstrada pelo sistema jurídico na resolução da epidemia de violência urbana que se fazia sentir. Callahan tornou-se um símbolo da insatisfação social e, por consequência, o filme foi um enorme – ainda que inesperado – sucesso comercial, mesmo considerando as muitas acusações de organizações de defesa dos direitos humanos de que estaria a incentivar a brutalidade policial.

Nasce o realizador
Certo é que Dirty Harry ganhou quatro sequelas (Magnum Force em 1973, The Enforcer em 1976, Sudden Impact em 1983 e The Dead Pool em 1988) e lançou em definitivo Clint Eastwood no imaginário do público, mantendo a reputação de duro, mas afastando-o do longínquo faroeste. Eastwood aproveitou a fama para, entre sequelas de Dirty Harry, arriscar um pouco mais e desenvolver competências, tanto no papel de actor como no de realizador, onde deu os primeiros passos.

Clint e o orangotango
Desse tempo destacam-se os filmes que fez com a companheira de então, a também actriz Sondra Locke, como The Gauntlet e Every Which Way But Loose. Neste último, contracena com um orangotango, uma aposta arriscada de carreira que se revelou incrivelmente acertada, pois uma vez mais o filme foi um enorme sucesso comercial. Tornou-se evidente que Eastwood tinha o apoio maciço do público. Faltava-lhe agradar à crítica.

O ansiado Óscar
A aclamação formal de Clint Eastwood chegou finalmente em 1992, ano em que venceu o seu primeiro Óscar pelo filme Unforgiven. O prémio, todavia, não dizia respeito à sua actuação, mas ao trabalho como realizador. Um sinal.

Transição natural
Com o passar do tempo, o velho Eastwood demonstrou que Unforgiven não foi apenas um golpe de sorte. Na verdade, a cadeira de director era-lhe tão natural que os 37 anos de carreira como actor e as 15 longas-metragens realizadas até àquele ponto pareceram apenas justificar-se como parte de um longo estágio de aprendizagem no processo de criação de filmes. Claramente influenciado por Don Siegel e Sergio Leone, Eastwood foi desenvolvendo, ao longo dos anos, o seu próprio estilo, tornando-se conhecido pelo carácter prático e despachado com que lidera o elenco, assim como pela liberdade de erro que permite em set.

Erros genuínos
Deve-se esta «liberdade de erro» a uma paixão de Eastwood pela actuação genuína em detrimento da trabalhada. Quando a actriz Meryl Streep viu pela primeira vez a versão final do The Bridges of Madison County, por exemplo, mostrou-se surpreendida pelas imagens escolhidas. «Usaste todos os meus erros», disse-lhe ela. «Sim, mas foram erros genuínos», explicou-lhe ele.

O triângulo fundamental
Para Eastwood, existem três elementos essenciais para se conseguir um grande filme: uma boa história, um ambiente de gravações silencioso e adequado para se trabalhar, e um elenco de actores sem nada a provar. Com o triângulo assente, surpreendeu a indústria com a abrangência de estilos explorados, alguns deles de modo bastante inovador, contrariando a percepção popular de que apenas saberia trabalhar filmes de acção.

O ansiado respeito
Depois do extraordinário, ainda que pouco conhecido, A Perfect World, e dos sucessos, a nível crítico e comercial, The Bridges of Madison County, Mystic River e Million Dollar Baby, Eastwood ganhou em definitivo o respeito da indústria. Adicionalmente, juntou mais alguns importantes prémios ao seu currículo, destacando-se, sem margem para dúvida, como um dos maiores realizadores dos tempos modernos.

Experiências pessoais
Em 2006, o seu passado no corpo militar, aquando da Guerra da Coreia, inspirou-o a realizar Flags of Our Fathers e Letters of Iwo Jima, um par de projectos verdadeiramente originais, executados de forma inédita em Hollywood. No primeiro, Eastwood retrata a célebre batalha de Iwo Jima sob a perspectiva das tropas americanas, e no segundo, vê o histórico conflito através do ponto de vista das forças japonesas, sendo a linguagem predominante do filme o japonês. Eastwood viria, aliás, a envolver-se frequentemente em projectos que se relacionassem de algum modo às suas vivências ou preferências pessoais, seguindo um caminho iniciado em 1988, quando o seu amor pelo jazz o levou a realizar Bird.

O tributo em Gran Torino
Changeling, em 2008, seria mais um grande êxito, nomeado para os Óscares, e ainda no final do ano, realizou e protagonizou Gran Torino, no qual assumiu a interpretação de um velho e preconceituoso veterano da Guerra da Coreia que se vê obrigado a alterar a forma de pensar após o falecimento da sua esposa. O argumento interessou-lhe, originalmente, por se identificar com o protagonista, e de facto este parece ser uma mescla de vários outros desempenhos de Eastwood ao longo da carreira. Encerradas as filmagens, o actor deu mesmo a entender que aquela poderia ter sido essa a sua despedida do grande ecrã, planeando dedicar-se em exclusivo à realização. Não se verificou, já que, ainda em 2012, protagonizou o filme Trouble with the Curve.

Enfim a actuação
A interpretação em Gran Torino valeu-lhe – finalmente – um prémio de interpretação, tendo sido eleito o melhor actor do ano pela National Board of Review of Motion Pictures. No entanto, conhecendo-se o seu enorme talento por trás das câmaras, não será estranho afirmar-se que, mesmo aos 82 anos, o melhor ainda estará para vir.

Óscares e Globos
Eastwood tem quatro Óscares (Melhor Realizador: Unforgiven em 1992; Melhor Filme: Unforgiven em 1992; Melhor Realizador: Million Dollar Baby em 2004; Melhor Filme: Million Dollar Baby em 2004), e um Prémio Memorial Irving G. Thalberg (1995). Venceu ainda quatro Globos de Ouro (Melhor Realizador: Bird em 1989; Melhor Realizador: Unforgiven em 1992; Melhor Realizador: Million Dollar Baby em 2004; Melhor Filme de Língua Estrangeira: Letters from Iwo Jima em 2006), mais um Prémio Cecil B. DeMille (1988).

Filhos e netos
O número de filhos de Eastwood aproxima-se, contudo, do seu número de prémios ganhos. São eles Kimber (1964, com Roxanne Tunis), Kyle (1968, com Maggie Johnson), Alison (1972, com Maggie Johnson), Scott (1986, com Jacelyn Reeves), Kathryn (1988, com Jacelyn Reeves), Francesca (1993, com Frances Fisher) e Morgan (1996, com Dina Ruiz). Tem ainda dos netos: Clinton (1984, filho de Kimber) e Graylen (1994, filha de Kyle).

A paixão pela música
O seu filho Kyle tornou-se músico de jazz. Clint apoiou-o desde sempre na carreira e participou, inclusive, no tema «Big Noise (From Winnetka)», do seu álbum Paris Blue. Eastwood é aliás um enorme apreciador de música, particularmente de jazz, e compôs parte das bandas sonoras de Mystic River, Grace is Gone e In the Line of Fire.

A paixão pelo golfe
Tem uma grande paixão por golfe, e é inclusive o dono do Tehàma Golf Club, em Carmel Valley, na Califórnia. É ainda o anfitrião de um torneio anual de golfe em Pebble Beach, que reúne celebridades e profissionais, no qual participou entre 1962 e 2002.

Na política
Na política considera-se Libertário, defendendo que ninguém deve interferir com a vida de ninguém. No entanto, tem um historial de apoio público a candidatos Republicanos, como Dwight D. Eisenhower, Richard Nixon, Ronald Reagan, Arnold Schwarzenegger, John McCain e, mais recentemente, Mitt Romney, em cuja campanha protagonizou o infame diálogo com uma cadeira vazia, na qual fingiu sentar-se Barack Obama. Menos conhecido sobre ele é o facto de ter assumido, entre 1986 e 1988, o cargo de mayor de Carmel-by-the-Sea, na Califórnia.

Anti-violência
Ao contrário da imagem que passa nos filmes, não fuma e é contra qualquer tipo de violência que não a de auto-preservação, em especial no caso da caça.


Artigo publicado na edição #19 da Revista 21

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