sábado, 5 de Janeiro de 2013

Juvenal: "Defendo os atestados de procriação e de voto"


O livro que mais marcou a minha infância chamava-se (momento humor de pastelaria: mas já não chama?) Nós e os outros. Nunca o li. Mas a lombada era das mais compostas da estante lá de casa, tinha letras em Arial Narrow Bold, uma escolha ousada para fonte, uma vez que, ao contrário da maioria, é paga e dá logo a certeza que se está diante de um escritor de outra estirpe, e impunha respeito como poucas, derivado também à largura de quase um polegar para além da dobra. Quem come gajas de quatro — check! — está familiarizado com esta medida que é a parte do polegar que um gajo lhes mete no cu até ao nó com a desculpa que dá mais jeito para segurar mas a verdade é que é um medidor de segurança de fazer cu, dependendo de a unha vir castanha. Aquelas quatro palavras, no seu conjunto, já faziam sentido no meu cérebro ainda reduzido e que assim permaneceu, não devido a doença mas a falta de estímulo porque nós morávamos nos arredores onde não havia televisão por satélite nem se conseguia comprar revistas das que traziam a programação e os mexericos — itens essenciais no desenvolvimento de qualquer cérebro saudável e que ambiciona um tamanho comparável aos demais. Dizia-me, do cimo da quarta prateleira onde eu ainda só chegava com um banco dos antigos — que os novos era para comermos à mesa da cozinha — que as pessoas não eram todas iguais. Fiquei sem saber, e continuarei assim por opção porque ler é o maior aborrecimento e toda a gente sabe que quem lê são as gajas e os paneleiros, se não passava de propaganda comunista ou se, como julgo, nos mostrava, por A+B, que há pessoas que valem mais que as outras porque têm mais dinheiro, personalidade e carros de alta cilindrada. É por esta mensagem implícita no nome que desde cedo defendo os atestados de procriação e de voto. Devia haver uns testes escritos e de medição do crânio, do tamanho do maxilar inferior, da distância entre os olhos e de unicelha que as pessoas faziam e que, mediante o resultado, lhes dava o direito a procriar, votar, morar no centro, entre outros direitos ou deveres que deviam ser apenas de uma minoria qualificada para tal. Estes testes (ainda) não existem. Mas são apenas uma questão de tempo até que as pessoas se apercebam que são essenciais para manter uma sociedade funcional e adequada segundo os padrões que nos podem preparar para um futuro ainda mais radioso.

Por: Juvenal

Crónica publicada na edição #17 da Revista 21

2 comentários:

"toda a gente sabe que quem lê são as gajas e os paneleiros"
loooooooooooool

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