segunda-feira, 12 de Novembro de 2012

Marlene Correia Ferraz vence Prémio Literário Revelação Agustina Bessa-Luís com A Vida Inútil de José Homem


«O romance A Vida Inútil de José Homem, de Marlene Correia Ferraz, é o vencedor do Prémio Literário Revelação Agustina Bessa-Luís, no valor de 25.000 euros, anunciou hoje a Estoril Sol que o instituiu há cinco anos.

O júri escolheu, por maioria, o romance de Marlene Correia Ferraz, psicóloga de 32 anos, considerando a "apreciável desenvoltura narrativa e uma relação criativa com a língua portuguesa", segundo a ata do júri a que a Lusa teve acesso. O romance "evidencia situações dramáticas da memória histórica portuguesa africana, num enquadramento interessante e, em certa medida, original", afirmou o júri no mesmo texto.

O júri foi presidido pelo escritor Vasco Graça Moura e integrou Guilherme d`Oliveira Martins, em representação do Centro Nacional de Cultura, José Manuel Mendes, pela Associação Portuguesa de Escritores, Maria Carlos Loureiro, pela Direção-Geral do Livro, Arquivos e Bibliotecas, Manuel Frias Martins, pela Associação Portuguesa dos Críticos Literários e, ainda, Maria Alzira Seixo e Liberto Cruz, como convidados, e Nuno Lima de Carvalho e Dinis de Abreu, pela Estoril Sol.

O Prémio Revelação Agustina Bessa-Luís foi instituído em 2008 por ocasião dos 50 anos da Estoril Sol que estabeleceu um protocolo com a editora Gradiva, que publica a obra vencedora. Ao galardão só podem concorrer autores portugueses até aos 35 anos, com um romance inédito e sem qualquer obra publicada no género, segundo o regulamento.

Marlene Correia Ferraz nasceu e vive em Viana do Castelo, tendo afirmado que o galardão lhe "veio dar corpo e alento". "Vianesa de corpo e vista", como se afirmou, Marlene Correia Ferraz sobre esta distinção da sua primeira narrativa, disse: "é um sopro nos meus dedos, mas um arrepio no coração". Quanto ao romance contou: "Comecei a escrevinhá-lo no outono do ano passado, entre folhas soltas com anotações sobre a guerra civil de Angola e alguns amores imperfeitos".

Para escrever A Vida Inútil de José Homem, a autora referiu os "documentários que o canal 2 [RTP2] projetou" e o facto de um "saber tão curto sobre esse intervalo de tempo e lugar na História" de Portugal e ainda "pela maturidade de poder cruzar as muitas versões e entendê-las como parte do mesmo acontecimento".

"Tudo aquilo que causa sofrimento incomoda, mesmo o que já faz parte da máquina das memórias, ou, como no caso, das imaginações. Na terra onde madurei há ainda homens que estiveram na guerra civil. Um deles pinta ainda hoje os animais e o arvoredo, as mulheres pretas e nuas e os homens soldados. Um vizinho também foi levado pela PIDE [polícia política do Estado Novo] e nunca mais voltou, só num grande silêncio, mas a história já não é a mesma", referiu.

A premiada referiu como influência direta para a escrita do romance, o filósofo espanhol José Ortega y Gasset. "Este texto terá sido rascunhado sobre a premissa de Ortega y Gasset, em que o homem é ele próprio e as suas circunstâncias, e que exploro continuamente no meu outro ofício da terapia. Há a vontade, mas há também as eventualidades. Há a fé, mas há também a evidência do vazio".

"Há um homem velho que se obriga a não desejar, há uma criança estragada pela guerra que semeia sentido e sentidos. Há diospiros, um cão abandonado que lambe feridas, amores que nunca começaram e aqueles que teimam em não acabar", prosseguiu.

Referindo-se ao estilo, afirmou: "Gosto particularmente de ler formas de escrita, dobrar a língua para dizer frases fabricadas de maneira original, personagens polidos com pormenor, estranheza e simpleza, lugares duros e sensoriais".

José Saramago é um dos autores que Marlene Correia Ferraz admira, descobriu recentemente Rentes de Carvalho, citou ainda Gonçalo M. Tavares, Valter Hugo Mãe, e referiu "a delicadeza do Afonso Cruz e a lucidez de Agustina Bessa-Luís".

"Encantam-me os textos dos escritores russos do século que passou, os contos de Kafka e Allan Poe, Truman Capote, Virgínia Woolf, alguns, os dedos vão folheando mais: Ruiz Zafón, J. M. Coetzee, Mia Couto", acrescentou.»

Via Diário Digital.

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